https://public-rf-upload.minhawebradio.net/236773/slider/7c7a41eb26a95a9658fa0578b0d329c3.png
Com vítimas de desastre à espera de reparação, BHP busca fusão bilionária
Regional
Publicado em 20/05/2024

Autora de oferta multibilionária para se fundir com outra gigante mundial da mineração, a multinacional BHP Billiton – uma das controladoras da mineradora Samarco, responsável pela tragédia que em 2015 devastou a Bacia do Rio Doce a partir de Mariana, na Região Central de Minas – poderia arcar com 98,5% das indenizações pedidas pelas vítimas em ação na Inglaterra, caso usasse nas reparações o valor que ofertou no negócio. Entre repasses de ações para a megafusão, a BHP ofereceu ao conselho de administração da também mineradora Anglo American, em valores corrigidos na cotação do dólar, R$ 226,3 bilhões (US$ 44,12 bilhões). A proposta, concretizada no último dia 7, foi recusada.

A tragédia de Mariana ocorreu há quase nove anos, quando a Barragem do Fundão, operada pela Samarco, se rompeu, devastando o que encontrou pela frente com uma avalanche de lama que arrasou o povoado de Bento Rodrigues, matou 19 pessoas, deixou cerca de mil desabrigadas e devastou o meio ambiente ao percorrer a Bacia do Rio Doce de Minas Gerais ao oceano, no litoral do Espírito Santo. Sem reparação completa e considerando insatisfatórias as respostas da Justiça brasileira, 700 mil atingidos, entre mineiros e capixabas, processam desde 2018 a BHP, multinacional anglo-australiana, na Justiça da Inglaterra. O valor da causa defendida pelo escritório internacional Pogust & Goodhead é estimado em R$ 230 bilhões.

Perguntada se a ação movida pelos atingidos em Londres pode ter atrapalhado a negociação com a Anglo American, principalmente porque a proposta envolve pagamento em ações, a BHP Billiton não respondeu. Mas essa é a impressão transmitida à reportagem por fontes que acompanham o processo, uma vez que, caso ocorra o julgamento, em vez de um acordo, a má publicidade e também questões de governança podem depreciar o valor das ações da BHP no curto prazo. Sem falar que, se a multinacional for condenada a somas ainda mais vultosas, isso poderia fazer os valores de seus papéis despencarem.

 

A angústia e o mercado

Apesar das dificuldades, enquanto vítimas da tragédia de Mariana seguem sem perspectiva de reparação e aguardam posição da Justiça internacional, a BHP demonstra que seu interesse pela fusão é grande. A primeira oferta feita anteriormente, e recusada em 26 de abril pelo Conselho de Administração da Anglo American, foi de US$ 39 bilhões. Ou seja, a proposta mais recente aumentou a proporção de ações que a BHP oferta, aumentando em 13% o valor corrigido para as ações no momento. Ainda assim, foi rejeitada.

A união entre BHP e Anglo American daria origem a um gigante global no setor da mineração, consolidando a posição de maior mineradora do mundo. A própria BHP destaca a obtenção de um portfólio de ativos de alto valor, abrangendo cobre, potássio, minério de ferro, platina e carvão metalúrgico.

Traria também um impacto significativo ao mercado brasileiro, já que a Anglo American possui as reservas do complexo Minas-Rio, que produziram 24 milhões de toneladas de minério de ferro em 2023, gerando US$ 1,4 bilhão. No início do ano, a Vale comprou 15% do covmplexo.

“A mais recente proposta da BHP novamente falha em reconhecer o valor inerente à Anglo American. A proposta da BHP também continua a ter uma estrutura altamente pouco atraente. Isso deixa a Anglo American e seus acionistas em risco devido à substancial incerteza e ao risco”, disse Stuart Chambers, presidente da Anglo American.

“A BHP apresentou uma proposta revisada ao Conselho da Anglo American que acreditamos firmemente ser vantajosa para os acionistas da BHP e da Anglo American. Estamos desapontados que esta segunda proposta tenha sido rejeitada. A proposta revisada representa um aumento de 15% na taxa de troca da fusão e eleva a participação acionária agregada dos acionistas da Anglo American no grupo combinado para 16,6%, ante 14,8% na primeira proposta da BHP”, disse Mike Henry, CEO da BHP.

 

Atingidos seguem à espera de justiça

Derrotada em 2022, quando o Tribunal de Apelação de Londres decidiu julgar a ação dos atingidos pela tragédia de Mariana, a BHP Billiton procurou incluir a Vale no processo, uma vez que cada mineradora responde por metade do controle da Samarco, empresa que operava a barragem que se rompeu em 5 de novembro de 2015. O julgamento em Londres, marcado para começar em 7 de outubro de 2024, tem perspectiva de durar 14 semanas.

Quase nove anos depois da devastação provocada pela ruptura e desprendimento de quase 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro – sete vezes mais do que o rompimento de Brumadinho (2019) –, poucos foram ressarcidos e conseguiram retomar o curso de suas vidas. A muitos deles, restou tentar amparo na Justiça na Inglaterra.

 

Comentários